SISTEMAS INTEGRADOS: GUARDIÕES DO CONHECIMENTO OPERACIONAL NAS EMPRESAS
Em tempos de quebra do quadro funcional... Yes! Nós temos ERP
Por: Luis Enrique Villanueva[1] (CEO da ELLU Engenharia e Consultoria)
À semelhança do que investidores fazem em tempos de crise quando buscam refúgio em moedas fortes ou ouro para preservar seu capital; nestes tempos de pandemia, empresas vêm buscado sobreviver a partir da intempestiva e vertical redução de custos, fazendo demissões, reduzindo salários e carga horária, antecipando férias, adotando regime home office, coworking, entre outras medidas que trazem como efeito colateral a inevitável perda do conhecimento adquirido nas empresas. Em soma, de um lado freiam-se desembolsos e preserva-se o Caixa; porém, do outro lado desarticula-se a força produtiva e operacional que lhe dá sustentabilidade e, por conseguinte, mexe-se na cultura organizacional, além romper processos e rotinas de trabalho plenamente consolidados, solidificados ao longo de anos e anos de atuação. Obviamente, diante das circunstâncias, uma Escolha de Sófia, dirão alguns; mas, o certo é que não há muito espaço de manobra para o empresário se mover. Então, como contornar esse impasse? À diferença do investidor que pode perder dinheiro, nas empresas pode se perder dinheiro e conhecimento, resultando em hiato operacional de efeitos imprevisíveis.
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Pelo conceito de hiato utilizado pelos economistas Tinoco e Giambiagi (2018)[2] quando se referem ao grau de ociosidade de uma economia, medido no caso, como a diferença de quanto ela pode produzir (quando empregados todos os fatores de produção em seus níveis de utilização normais) mantendo um equilíbrio macroeconômico (produto potencial) em relação a quanto ela produz de fato num determinado momento; avaliam por essa análise que, quanto maior a ociosidade, em tese, menores serão as pressões inflacionárias, uma vez que aumentos de demanda podem ser atendidos com aumento da produção (em vez de aumentos de preços). Obviamente, se referem à queda no uso da capacidade instalada. Destarte, até que a economia volte a operar novamente à plena capacidade, o crescimento da produção se tornaria mais fácil. Contudo, ocorrer que durante esse hiato da economia os fatores de produção poderão ter sofrido importantes desgastes e aí o problema adotaria uma outra tonalidade. Por exemplo, em relação à mão de obra: será que ela se tornou mais ou menos eficiente? Será que os anos de desemprego ou subemprego elevados causaram danos permanentes à força produtiva?
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Esses questionamentos são os que norteiam a pesquisa neste artigo. Nessa linha de raciocino quanto aos efeitos causados sobre a capacidade operacional da força de trabalho remanescente nas empresas, decorrente das repentinas e traumáticas demissões realizadas e efetivas reduções de quadro funcional durante a pandemia, cabe se perguntar: o que terá ocorrido nas empresas em função desses repentinos e apressurados cortes na folha de pagamentos e quais os efeitos sobre a cultura organizacional e os processos e rotinas operacionais de trabalho? Obviamente, aqui estamos nos referindo aos que ficaram na empresa em relação à urgência de dar continuidade aos processos normais e rotineiros do negócio em seu dia a dia. Os que já saíram não estão mais e deixaram um vazio a descoberto. Assim, é permitido especular que importantes trechos e, não raro, campos inteiros de conhecimentos, tenham sido perdidos no processo. Força de trabalho qualificada, treinada e capacitada para funções operacionais específicas e estratégicas únicas da empresa, poderão ter sido levados consigo esse arcabouço de know-how e expertise de maneira repentina, sem tempo hábil para assegurá-los ou transferi-los aos que ficaram. Nesse contexto, como recompor as lacunas criadas e o que poderá ajudar a preenchê-las?
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Ou ainda, como a empresa recriará sua estrutura para uma consistente retomada das atividades, se um dos fatores de produção (a mão de obra) foi seriamente prejudicado, não apenas pelo conhecimento que se foi, mas principalmente pelos que ficaram e que agora terão de dar conta do recado assumindo processo e rotinas que mal conhecem e que provavelmente ainda foram seriamente danificados? Funcionários para o qual não foram treinados e nem qualificados, desandando numa espécie de empregados subempregados que dessa vez ainda terá de assobiar e chupar cana ao mesmo tempo? Isto sem falar nos impactos causados à cultura organizacional e às relações de trabalho que certamente tornar-se-ão, mas instáveis. O consolo que se sobrepõe ao mea-culpa do empresário, que – em essência – não tem culpa alguma, ancora-se na esperança de que a empresa estará mais enxuta em termos de custos e, portanto, mais bem preparada para a retomada das atividades, competir no mercado e aguardar a paulatina volta dos lucros. Contudo, essa crença não se justifica e menos ainda soa consistente, a não ser como produto da automotivação do empresário para se manter firme e esperançoso em relação à retomada. Até porque olhando para experiências do passado como a Reengenharia e o Downsizing (só para ficar em dois deles) e que, à época, não se revelaram satisfatórios mesmo quando sua implantação foi planejada, o que dizer desta vez, em que a ruptura foi intempestiva, imprevista e nada planejada.
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Portanto, diante dessa crua realidade e para já utilizar uma frase da moda, pondera-se que a volta das atividades no contexto do “novo normal” deverá advir do conhecimento parametrizado que há inserido nos Sistemas Integrados de gestão empresarial[3]; não na sua programação técnica ou na linguagem de máquina utilizada, mas nos objetivos que o tornam essencial à funcionalidade operacional e negocial das empresas em si e que, de per si, constituem-se na própria essência e propósito de sua existência. Isto é, implícita à própria automatização de processos, há o mapeamento prévio deles. Estes Sistemas Integrados constituem-se verdadeiros Manuais de Funções, não estáticos, mas dinâmicos, que orientam e, não raro, “norteiam”, “obrigam” e “corrigem” os diversos setores da empresa a segui-los impreterivelmente sob risco de travarem a fluidez do processo se não acatados conforme a parametrização demanda. Portanto, pondera-se que estes Sistemas, em certa forma venham “suprir” os vazios de conhecimento deixados pelos que saíram e permitirá aos que ficaram, recompor o “quebra cabeça” e peças faltantes dos processos e rotinas pouco ou mal conhecidos. Assim, pondera-se que os Sistemas garantam a histerese[4] operacional necessária à empresa durante esse tempo destinado ao novo aprendizado e à nova acumulação de conhecimentos.
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Isto poderá ocorrer graças a que processos e rotinas estão fortemente entranhados nos Sistemas Integrados devido a que sua própria concepção decorre daqueles e não raro definem até mesmo as formas mais eficientes, padronizadas e seguras de se realizar as atividades operacionais respeitando as especificidades de cada empresa; mas, também porque estes Sistemas poderão garantir a histerese durante um tempo prudencial tal que permitirá a subsequente e necessária reacomodação da força de trabalho remanescente às reais exigências operacionais da empresa, minimizando – à medida do possível – o hiato criado em função da redução do quadro funcional promovido para encarar a crise. Por outras palavras, os Sistemas Integrados constituem-se hoje em verdadeiros guardiões do conhecimento dos processos e rotinas operacionais dentro das empresas e permitem até mesmo relativizar a funcionalidade da força de trabalho. Obviamente, questões estratégicas ficam de fora desse contexto.
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Anteriormente aos Sistemas Integrados, processo e rotinas eram concebidos de maneira dissociada e isolada por módulos desconexos de um todo e que depois a soft house “juntava” e comercializava como sendo um Sistema, mas que na verdade eram módulos independentes que corriam soltos e em paralelo sem se comunicarem automaticamente. Uma pandemia como a do Covid 19, naqueles tempos teria sido desastrosa para a preservação do conhecimento adquirido nas empresas. Hoje, os Sistemas Integrados, à medida que operacionalizam eficientemente os negócios e apoiam na tomada de decisões, o acúmulo de conhecimentos que há neles, relativiza não apenas a quantidade e qualidade da força de trabalho que havia ou há na empresa, mas ainda dispensa a sua presença física (pessoal pode atuar em regime de home office sem maiores transtornos), permitindo recompor o lapsus de conhecimento num menor espaço de tempo.
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Assim, sendo, pode se concluir que se na empresa há Sistemas Integrados, tanto melhor será para recompor o conhecimento e dilui-lo pela força de trabalho remanescente, pois que esses ao guardar processo e rotinas implícitos à sua sistemática, poderão sustentar a histerese operacional da empresa como um todo e com isto se preparar para empreender a retomada com claras capacidades competitivas, principalmente em relação àqueles que não dispõem destes sistemas. Todavia, importante alertar para uma questão relevante e que não é sanada pelos Sistemas Integrados e nem poderia pois que não é propósito dela cuidar disso, e diz respeito à questão das rachaduras observadas na cultura organizacional e que invariavelmente terá sofrido sérios traumas e que, por consequência, resultará em desequilíbrio das relações trabalhistas com imediatos impactos sobre rotinas e processos produtivos. Mas, esse é tema para um próximo paper.
[1] Estudou Mestrado em Finanças e Economia Empresarial pela Universidade Estácio de Sá (MADE/UNESA), Pós graduação em Engenharia Econômica pela Universidade Gama Filho (CEPAC/UGF), Pós graduação em Qualidade pela Universidade Gama Filho (CEQ/UGF) e é formado em Ciências Contábeis pela Universidade Nacional Mayor de San Marcos (UNMSM), de Lima – Peru.
[2] Guilherme Tinoco e Fábio Giambiagi – Perspectiva DEPEC – O Crescimento da Economia Brasileira 2018 – 2023, BNDES, abril 2018.
[3] Entendidos aqui como o conjunto indissolúvel formado pelo MRP (Material Requirements Planning), MRP II (Manufacturing Resources Planning) e ERP (Enterprise Resources Planning).
[4] A histerese é a tendência de um sistema conservar suas propriedades na ausência de um estímulo que as gerou, ou ainda, é a capacidade de preservar uma deformação efetuada por um estímulo.